"O centenário da construção do Hotel das Termas"

O ano de 1915 será uma data relevante para o fomento do turismo termal nas Taipas. Inicia-se a construção do Hotel das Termas, o maior estabelecimento hoteleiro na povoação. A traça é da autoria do arquiteto portuense Eduardo da Costa Alves.


O aglomerado de Caldas das Taipas situado na freguesia de São Tomé de Caldelas, apresenta ao longo dos séculos XIX e XX, características que, sem serem únicas na área geográfica limitada pelo Vale do Ave, têm contudo algumas singularidades, que o tornam um objeto de estudo aliciante para o investigador em Ciências Sociais e Humanas. Às características peculiares da área construída, consequência primeira do turismo termal e das funções que este atraiu, aliaram-se outras, como sejam a situação geográfica privilegiada, a par da atuação de edis dinâmicos, que permitiram dotar o núcleo populacional de infraestruturas à data pouco comuns na maioria dos núcleos populacionais do Minho. Esta dinâmica assentou, fundamentalmente, na especificidade do termalismo, cujos reflexos desde cedo se fizeram sentir nas características morfofuncionais do lugar considerado, contribuindo para que a povoação merecesse destaque dentro de todas aquelas que até então integravam o concelho de Guimarães.

A própria situação geográfica deverá ter sido um factor que contribuiu decisivamente para o crescimento da povoação, na margem direita do curso do Rio Ave – onde este se estreita em meandros – atravessando longitudinalmente quase toda a freguesia (vila desde 1940). Posicionada no cruzamento de artérias tão importantes, como sejam aquelas que ligam Braga com Guimarães e outras ramificações, que se estendem pelo Vale do Ave, como Famalicão, Vizela e Póvoa de Lanhoso, não se encontrando muito afastada do núcleo urbano do Porto.

A grande procura das termas deve-se por conseguinte às propriedades terapêuticas das suas águas tépidas, que brotavam das diáclases de granito porfiróide através de duas captações (“Banhos Velhos” e “Banhos Novos”), com excelentes resultados no tratamento das afeções cutâneas e em doenças do aparelho digestivo e respiratório. Uma prova da importância da atividade termal do novo balneário (“Banhos Novos”) resulta do facto de, em 1907, ainda na fase de construção de uma das alas, terem aí sido administrados mais de 2000 banhos de imersão, duches, inalações-pulverizações e irrigações.

Após a publicação da Lei n.º1152, que criou em 1921 as Comissões de Iniciativa, o turismo nas Taipas sofre um renovado impulso. Pelo Decreto-Lei n.º 27424, de 31 dezembro 1936, em substituição das Comissões de Iniciativa são criadas as Juntas de Turismo. Imediatamente é formada a Junta de Turismo das Taipas, que nas décadas seguintes, juntamente com a Junta de Freguesia, irão proceder à construção de piscinas para adultos e crianças, ringues de patinagem, parque infantil, campos de ténis, parque de campismo e de um posto de turismo.

Em 1905, a Câmara Municipal de Guimarães aprovou a proposta de arrendamento do Estabelecimento Termal das Taipas (“Banhos Velhos”). Em 1906 José Antunes Machado, morador nas Taipas, arremata pelo lanço de 520$000 réis anuais, a concessão da exploração industrial e comercial das nascentes de águas termais. Nos anos seguintes, o aludido concessionário vai dar início à implementação de uma série de infraestruturas, como sejam uma “buvette” de captação e distribuição das águas minero-medicinais e de um moderno balneário (designado de “Banhos Novos”).

No entanto, José Antunes Machado depressa cede os direitos de exploração a um consórcio denominado Empresa Termal das Taipas S.A.R.L. criado por escritura pública de 4 de maio de 1910, com todos os direitos e obrigações constantes do contrato celebrado em 1906. Porém, em abril de 1915, procede-se a uma alteração nos termos do contrato, ficando estipulado que, em caso de rescisão do acordo, a Empresa Termal ficava obrigada a entregar todas as instalações termais à autarquia, com exceção de todos os terrenos e edificações adquiridos a partir dessa data. Este documento foi celebrado, certamente, já com a intenção por parte dos acionistas da Empresa, de construir uma unidade hoteleira, com vista a potencializar os recursos hidrotermais.

O ano de 1915 será uma data relevante para o fomento do turismo termal nas Taipas, pois inicia-se nessa altura a construção do Hotel das Termas, o maior estabelecimento hoteleiro na povoação, com 69 quartos. A traça é da autoria do arquiteto portuense Eduardo da Costa Alves. A Primeira Guerra Mundial originou a carestia de materiais e a falta de operários, provocando assim sucessivos atrasos na construção da última ala do hotel, que apenas ficaria concluída em 1924. Em 1918, esta moderna unidade hoteleira é inaugurada, no mesmo período em que são abertos, no nosso país, o Hotel Termal de Caldas da Saúde e o Salus - Hotel do Vidago.

O Hotel das Termas construído pela Empresa Termal das Taipas S.A.R.L. detentora até 1986 da exploração das águas termais, possuía uma ampla galeria envidraçada, que possibilitava aos seus hóspedes deslocarem-se diretamente do quarto para o balneário termal ao abrigo das correntes de ar. No rés-do-chão desta unidade hoteleira encontrava-se um monumental átrio, sala de jantar (com piano de cauda), sala de leitura e escrita, sala de fumo, sala de jogos, barbearia, cozinha e jardim interior. No seu interior existiam duas banheiras de imersão em mármore, semelhantes às existentes no balneário termal, para os hóspedes, que pretendessem realizar tratamentos termais no próprio hotel. O acesso ao primeiro piso efetuava-se por duas majestosas escadarias decoradas por azulejos com figuras femininas. O próprio mobiliário, na época, era considerado moderno, com o monograma “HT” e possuía serviço de louças exclusivo produzido pela fábrica de porcelana da Vista Alegre. Este edifício era enquadrado por um frondoso parque, possuindo garagens e campos de ténis para os seus hóspedes.

A dinâmica do termalismo taipense está bem patente no conforto deste estabelecimento hoteleiro frequentado por ilustres visitantes. Destaca-se o Presidente da República General Óscar Carmona, que aí esteve hospedado com a sua família, aquando do evento das Comemorações do Duplo Centenário, em Guimarães (1940). Outras personalidades de relevo, podemos indicar, a título de exemplo: o escritor Ferreira de Castro e o pintor Amadeu de Sousa Cardoso.

Um ano após do lançamento da primeira pedra do Hotel das Termas, o Grande Hotel Vilas, edificado na 2.ª metade do XIX, sofre importantes obras de ampliação. Com 23 quartos, funcionaria até ao início da década de 90, do século XX. As restantes unidades hoteleiras (Hotel Braga e o Hotel das Taipas) teriam uma duração efémera, sofrendo a concorrência do Hotel das Termas e do Grande Hotel Vilas. Em 1996, o Hotel das Termas será alvo de obras de remodelação e de ampliação, que o descaracterizaram, embora se tenham mantido algumas das suas características representativas da denominada “Arte Nova”, nomeadamente os azulejos das suas fachadas principal e traseira.

Em suma, o ano de 2015, corresponde para as Caldas das Taipas, um período de triplas comemorações: centenário da construção da igreja matriz (11 abril de 1915); centenário da construção do Hotel das Termas (3 outubro 1915) e os 75 anos de elevação à categoria de vila (19 junho de 1940).


Historiador, docente na Escola EB 2, 3 de Briteiros
António José Oliveira (texto publicado no jornal Reflex Digital da Vila das Taipas)

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