Arraial de S. Crau esteve sábado em Lagos

A Confraria Carnaval de Lagoas, vai realizar no próximo dia 14 de junho, a partir das 10h30, junto à capela de São Crau (Rua de Lagoas em Santo Adrião, Vizela) o Arraial de S. Crau. 

O evento realiza-se com objetivo de angariar fundos para o Carnaval de Lagoas 2026 e para uma futura sede para a Confraria do Carnaval de Lagoas.

O arraial decorre ao longo de todo o dia de sábado, com destaque para a atuação pelas 20h00 do Grupo dos Amigos das Concertinas de Vizela.

O evento realiza-se com objetivo de angariação de fundos para o Carnaval de Lagoas 2026 e uma futura sede para a Confraria do Carnaval de Lagoas.

O arraial vai estender-se pelo almoço, lanche e jantar do próximo sábado, pelo que a Confraria do Carnaval convida toda a população a juntar-se nesta festa que se denotará bonita, cheia de alegria e animação, com boa comida, torneio de sueca, insufláveis para as crianças, e muita exaltação com atuação de concertinas.



CAPELINHA DE S. CRAU

Durante bastantes anos, a capelinha de S. Crau  esteve numa espécie de semi-abandono. E bastantes são também as fotografias tiradas por nós ao longo de vários anos, que nos deixam perceber a evolução de degradação progressiva. Da capelinha e do recinto envolvente.

Como é de (quase) todos sabido, ora desta capelinha ora do nicho de “Alminhas” em Silvares das quais daremos a conhecer pormenores na devida oportunidade, é de um lado ou do outro que sai a procissão de velas que sobe à Senhora da Tocha na noite, véspera da sua “festa”, no domingo da Ascensão. Que para o ano, será a 10 de maio.

Em anos anteriores, ainda pudemos ver que no dia da procissão de velas, a capelinha estava aberta e nela se via o S. Crau no altar respectivo. Então, ainda em regular estado de conservação. Alguns anos depois, apenas se via a imagem em pequenina mesa mas já sem o altar cuja velhice  o terá apodrecido. Então, além da capelinha aberta, o recinto envolvente encontrava-se asseado e limpo de ervas e rodeado pelas várias japoneiras ou camélias onde por entre a alvura das flores de umas, sobressaía o rubro de outras. Chegou a haver, ali, uma espécie de mini-jardim, com lago miniatural onde por vezes esguichava um chafariz. Ao lado direito, pequena ramada e à esquerda, alta e esguia palmeira de folhas muito lá em cima como leques a abanar.

Houve um tempo em que a imagem da S. Crau foi roubada. Uns tempos depois, ela apareceu numa linha de água dos lameiros da propriedade, cuidadosamente muito bem embrulhada, o que permitiu que a imagem não se tivesse degradado. E para se evitar então novo roubo, o dono da propriedade e também da capelinha e seu recheio, por prudência, levou-a para sua casa e à capelinha a trazia na véspera de cada saída da procissão de velas, para veneração dos devotos. Que os teve. E muitos que até de longe vinham cumprir as suas promessas. De entre outras maleitas, ele era advogado do gorgomilo nas crianças.

Tempos depois, encontrámos, guardadas numa arrecadação, partes da talha do altar e do emolduramento envolvente do mesmo altar. Todavia, vimos ainda muito mais: o harmónio pequenino mas de quatro oitavas embora sem registos de sonoridade e de timbre. E o mais curioso é que estava ainda funcional e afinado! Um harmónio igualzinho ao mesmo em que nós aprendemos, pelos nossos catorze anos aprendemos a tocar na Tamanca, em Braga. E desses restos do altar e talha envolvente nós temos fotografias. Se hoje a capelinha não tem nenhum ato de culto, há cinquenta e mais anos ela era bastante concorrida. Os já falecidos sacerdotes P. Adolfo e depois o P. Simões nela celebravam missa todas as segundas-feiras da semana e, por vezes, também ao domingo. E parece que terá sido já no tempo deste último que deixaram de ser lá celebradas missas. Na capelinha do S. Crau houve também durante anos a devoção do terço no mês de Maio, o “mês de Maria”. Onde se cantava e o harmónio era tocado pela D. Rosinha viúva do snr. Leão e moradora ali junto aos “tanquinhos”. E parece que até na capelinha se ensinava a “doutrina”. Isto, num tempo  em que os muitos altares nas igrejas  não chegavam para tanto sacerdote celebrar missa. Falámos com diversas pessoas que muito bem se recordavam desse tempo e dele nos deram preciosos testemunhos que temos registados.

Recordamos que, neste pormenor, quando nós iniciámos os nossos estudos com vista ao sacerdócio, só do nosso curso éramos mais de cem! E no referido seminário da Tamanca nos quatro cursos que lá funcionavam, éramos quase quinhentos! E quando na sua da cidade tínhamos de atravessar a rua, os poucos automóveis desse tempo tinham de esperar uns bons minutos até que a rua ficasse desimpedida. Imagine-se que até os elétricos que subiam e desciam a Rua do Souto, que é estreitinha, tinham de parar para que a pudéssemos descer ou subir quando íamos aos pontificais da Sé. Só nós. Fazíamos multidão! E, a exemplo do que se passava na capela de Lagoas em termos de culto, o mesmo acontecia nas capelas das redondezas.

No lintel frontal da capelinha está uma inscrição em português arcaico e diz o seguinte: “FRANCISCO DARAUJO M. FAZER ERA 1751”.

Nas nossas deslocações frequentes a Tagilde, pelo menos duas vezes por semana, começámos entretanto a ver obras na estrada. Mais precisamente na construção de passeios para peões. De um e outro lado. E o local foi começando a aparecer mais asseado e mais funcional. 

Antes, porém, uns tempos, começou a nascer por trás um prédio, o que alarmou alguns amigos da capelinha e dessa preocupação nos vieram dar conhecimento. Para sermos nós a denunciar essa preocupação! Hoje, porém, estamos  crentes de que tal preocupação terá desaparecido, dado que e quanto  a nós, as obras encetadas em nada vieram prejudicar a capelinha. Pelo contrário, vemos até que os novos proprietários do terreno e da capelinha, têm vindo a mostrar esmero e carinho pela requalificação não só da capelinha como do seu átrio, nas obras em curso desde o portãozinho de acesso e escadas na descida, como da laje ao lado e mesa e bancos. Tudo em granito  em rústico rústico. Do lixo e matagal que tolhiam a capelinha e o bate de algumas japoneiras, depois de limpo,  ainda restam duas japoneiras ou camélias de flor rubra. Como resta a alta e delgada palmeira. Está a ser bem calçado o murinho de suporte da capelinha à direita. E não me surpreenderá nada se, daqui mais algum tempo, o nicho da sineta vier a ser ocupado por outra e o seu badalo cheio de incontrolada alegria no baloiçar do seu bronze a chispar de oiro, vier a ouvir-se no seu estridente tin-tin!-tin-tin!-tin-tin. é que e tanto quanto ficámos a saber, a imagem do S. Crau também regressou a Lagoas. E - quem sabe? - pertinho da imagem do santo regressada à sua capelinha se saboreiem merendas, na mesa de pedra e à sombra das japoneiras que restam. Quem sabe também se ainda ao som dos acordes da concertina, seja possível ouvir-se cantigas do POVO numa desgarrada ao desafio, a recordar os velhos tempos das romarias e da sadia vida campestre de que restam agora poucas, estreitas e verdes leiras dos muitos campos que foram a quinta de Lagoas. E, o mais importante ainda, que o culto a S. Crau venha a ser também ressuscitado.

 A finalizar esta nossa incursão pelos meandros de Lagoas e capelinha de S. Crau, devemos informar que, a propósito da capelinha e dos seus hábitos de há mais de cinquenta anos, entrevistámos uma boa meia dúzia de pessoas, de quem recolhemos preciosos testemunhos. Pode ser que, um dia, desses diálogos deixemos aqui alguns episódios.

TEXTO DE José Pedro Carvalho Marques (em 2017)

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