CDS/PP - O Concelho de Vizela

Notulas geográficas, laborais e históricas do Vale do Vizela



A chamada região do Vale do Vizela é constituída por uma área territorial com cerca de 66 Km2, com fronteiras naturais, situa-se na convergência das Províncias do Minho e do Douro Litoral, sendo composta pelas freguesias de Conde, Inflas, Lustosa, Moreira, Penacova, Regilde, Revinhade, Santa Eulália, Santo Adrião, Santo Estevão, S. Faustino, S. João, S. Miguel, S. Jorge, S. Paio, Tagilde, Vila Fria e Vilarinho, com uma população que ronda os 45.000 habitantes. O principal polo é a localidade vulgarmente conhecida por Caldas de Vizela, elevada a Vila em 1929 e a Cidade em 1998, mergulhando as suas raízes para além da fundação da própria nacionalidade.
É banhada pelo rio do mesmo nome que atravessa a região de nascente a poente, com um percurso de 40 Km desde a nascente até à confluência com o Rio Ave. O Rio Vizela, cantado por vários poetas, serpenteia por entre campos verdejantes, com margens de vegetação luxuriante bem características da região minhota.
Embora algumas das freguesias tenham expressão rural, a localidade-sede é uma desenvolvida cidade da província, com uma malha urbana de prédios de grande beleza e valor. As Termas e as Indústrias de Têxteis, Vestuário e Calçado, são as principais actividades laborais. Vizela orgulha-se de ter sido no seu solo que se construiu e laborou a primeira fábrica de papel extraído de pasta de madeira, pioneira no género em toda a Europa, destruída pelas tropas francesas, na retirada da segunda invasão napoleónica, como retaliação pela perseguição que lhes foi movida pelos naturais da região.

As Termas foram, no entanto, a primeira actividade laboral organizada a partir do funcionamento do actual balneário, cuja construção terminou em fins do século XIX, para aproveitamento das águas minero-medicinais que brotam da terra a uma temperatura superior a. 60°c., águas outrora exploradas pelos Romanos que aqui construíram os primeiros "banhos"; e, mais tarde, aproveitadas por Celtas, Godos e Árabes, que igualmente nelas procuravam alivio e cura para os seus males, o mesmo sucedendo depois com Suevos e Visigodos, aquando das invasões bárbaras.

Com o balneário a funcionar já em pleno, a actividade termal, apoiada pela existência de uma cadeia de estruturas composta por hotéis, pensões, restaurantes e simples casas de hóspedes, veio a ser uma atracção permanente para a fixação de muita gente, pois, nessa altura, era impraticável a deslocação e regresso no mesmo dia aos doentes de médias distâncias para os seus tratamentos, como hoje acontece. A localidade teve, nessa altura, uma forte evolução, alterando significativamente a sua forma de vida pela presença de numerosíssimos aquistas, entre os quais predominavam as colónias brasileira e inglesa, com as duas a exercer acção preponderante nos buliçosos dias que, então, alegravam a vida balnear da época, sendo a presença da primeira vincada pela denominação dada aos dois principais hotéis de "Cruzeiro do Sul" e "Sul Americano", bem como de "Bristol" a um dos dois Casinos então existentes, no caso da colónia inglesa.

Bailes, piqueniques, arraiais minhotos e as famosas batalhas de flores deram, à Vizela dessa altura, notória celebridade, tal era o entusiasmo e o encanto de que se revestiam essas exuberantes manifestações de alegria. Para que se possa ter uma ideia do verdadeiro clima de loucura em que se desenrolavam essas batalhas de flores, bastará dizer que, no auge da "refrega", por vezes se jogavam jóias de adorno pessoal, tais como anéis e alfinetes valiosissímos. Como atrás ficou dito, por essa altura, Vizela dispunha de dois casinos com zonas de jogo próprias e, nos seus salões, diariamente actuavam orquestras e grupos de bailado.

Depois desse apogeu, que se prolongou por vários anos e que conferiu a Vizela o título de Rainha das Termas de Portugal, registou-se um período de declínio que se acentuou com a preferência das praias pela juventude em consequência da "metamorfose" operada nos vestuários que permitiam aos jovens a exibição dos seus dotes corporais. Mas como o mundo é composto de mudança e, hoje, em todo o lado, cada um pode mostrar o que melhor lhe convém, termas e praias passaram a oferecer iguais possibilidades pelo que houve como que um regresso às origens sendo esta uma das razões pelas quais o termalismo está, de novo a merecer a atracção da juventude, embora em moldes diferentes do fascínio da saudosa "Belle-Époque". O acolhedor Parque de lazer, com árvores de rara espécie e de grande porte, local de diversão e também de refúgio nos dias estivais, continua à espera de uma revitalização que parece começar a esboçar-se.

O segundo grande impulso que a localidade recebeu foi através da industrialização, nos começos dos anos trinta, do século XX. A industrialização foi mesmo a grande sacudidela que de novo transformou Vizela, então acabada de ser promovida a Vila.

De começo, foram só os têxteis para o que se construíram fábricas, a maioria das quais nas margens do rio para aproveitamento da força motriz. Os postos de trabalho daí resultantes absorveram a mão de obra disponível para todos os dias do ano, em contraste com o que acontecia com o termalismo, cuja ocupação era apenas sazonal. A industrialização progredia a olhos vistos e dentro em, pouco tempo Vizela tinha fábricas construídas um pouco por todo o lado. Para a população residente, a vida modificava-se conferindo-lhe um salário para todos os meses do ano. Já não era preciso, durante o inverno, "emigrar" para o Porto, como anteriormente acontecia com os profissionais ligados à hotelaria e com os massagistas, por essa altura designados como friccionistas. O nível de vida, por isso mesmo, subiu, passando a construir-se várias casas pelo que a população aumentou.

Depois de um período de certa crise consequente de reflexos da Segunda Guerra Mundial, nos anos quarenta, os têxteis voltaram a ter procura e de novo se entrou numa era de expansão.

Nos anos seguintes, surgiram as indústrias de confecções e de calçado, convertendo Vizela numa zona mista de termalismo e industrialização. Foi pena que esta última actividade se instalasse um pouco anarquicamente, resultando, daí, uma promiscuidade de actividades bastante nociva.

Relatadas em termos sintéticos as principais nuances da história de Vizela no que concerne ao seu modus vivendi e às suas mais importantes estruturas, refira-se também a paixão independentista dos seus naturais, consubstanciada num ideal e numa luta que, começada em 1408, perdurou perto de seiscentos anos. Conta-se assim: no ano de 1361, el-rei D. Pedro doou a seu filho, o Infante D. João, as terras de Riba Vizela às quais concedeu independência administrativa. Conflitos gerados entre os Conventos de Roriz e de Guimarães, a par de outras vicissitudes da época, levaram à extinção da independência administrativa de Vizela, em 1408. Recorde-se que o tratado de aliança com a Inglaterra se firmou, em Tagilde, no ano de 1372, portanto durante os 47 anos de independência das terras de Vizela. Porém, nunca as gentes vizelenses se resignaram com a perda da sua autonomia administrativa, muito embora nos séculos XV, XVI, XV II raras iniciativas fossem tomadas para se tornar realidade tal desejo.

O nascimento, em 1836, de um novo concelho sediado em Barrosas englobando freguesias de Riba Vizela, espevitou os vizelenses para uma retomada da luta pela reconquista da liberdade municipal e daí renasceu a paixão e o ardor por tal desiderato.

Em 1852, sucedeu um facto curioso que consistiu no desvio de uma rota com passagem por Vizela programada para a Rainha D. Maria II, facto que indignou os vizelenses e os levou a desencadear uma série de protestos e a reclamarem, com veemência, a transferência de Vizela para o concelho de Lousada, na eventualidade de não ser possível a concessão da autonomia municipal.
Em 1914, 1926 e 1929 foram feitas novas tentativas para a reconquista da autonomia, as quais não resultaram. A última dessa série aconteceu em 1964, e, tal como as anteriores, também não vingou, não obstante ter recebido um parecer favorável da unta Distrital de Braga, órgão pelo qual, nessa altura, tinham de passar todas as pretensões dessa natureza.

Nesse ano, foi constituído o MRCV - Movimento para a Restauração do Concelho de Vizela- cujos elementos se propuseram dar continuidade à luta sem desfalecimentos e muito menos interrupções, pois, as tentativas isoladas não garantiam a conquista do objectivo, atendendo aos reflexos nocivos das negativas, cujas sequelas, que se mantinham por longo tempo, geravam sempre um clima de frustrações. Por isso, o MRCV desembainhou a espada e partiu, de rosto altivo e peito aberto, para uma série de batalhas que, ininterruptamente, haveria de travar ao longo de perto de trinta e quatro anos. Assumindo para si próprio o encargo económico da luta desencadeada, para a qual nunca teve, nem quis, financiamentos de quem quer que fosse, o MRCV percorreu milhares de quilómetros, de dia e de noite, batendo às mais diversas portas, para pedir compreensão e ajuda para a justa causa de Vizela. Nunca desistiu, mesmo quando sentiu à sua volta uma certa descrença pelo facto da pretensão ser fortemente contestada pelas Câmaras Municipais de Felgueiras, Lousada e Guimarães, particularmente por esta última. A estratégia destas câmaras consistia em procurar e evitar a todo custo, que a questão de Vizela subisse isoladamente a plenário pois agrupada a pretensões congéneres, facilmente confundiria a opinião pública. O MRCV por seu lado, desenvolvia todos os esforços para que o processo fosse votado isoladamente, sob o argumento de ser a mais antiga pretensão em todo país, a única que já tinha sido várias vezes debatida em plenário.
O P.P.M- Partido Popular Monárquico- foi o primeiro a apresentar um projecto de Lei de criação do Município de Vizela, derrotado por 11 votos em plenário da Assembleia da República em 1981. A questão de Vizela voltou de novo ao parlamento em 12 de Maio de 1982, o qual, por proposta do líder da bancada social democrata, Francisco de Sousa Tavares, deliberou que fosse feita uma Lei-quadro de criação de Municípios no prazo de 60 dias e, caso tal não fosse possível, expirado esse prazo, o projecto de Vizela voltasse a plenário para de imediato ser resolvido. Tal não aconteceu, pelo que esta deliberação da Assembleia da República foi uma promessa não cumprida. A 15 de Agosto de 1983, o Ministro da administração Interna do Governo do chamado Bloco Central veio a Vizela propor aos vizelenses um acordo que consistia em Vizela permitir a conclusão das eleições autárquicas não levadas a efeito por motivo de boicote, bem como a recolocação da via férrea, levantada em sinal de protesto, para que o Governo, logo após a reabertura do parlamento, fizesse votar uma Lei-quadro de Municípios e, paralelamente, aprovar a criação do Concelho de Vizela. Os vizelenses acreditaram na palavra do Governo, expressa pelo seu ministro em praça pública, colaborando na repetição do acto eleitoral que entretanto foi marcado e simbolicamente, colocaram os carris no seu lugar. Mas em Outubro, por pressão de Guimarães, que no dia da votação em plenário da Assembleia da República fechou as portas da própria Câmara, o concelho de Vizela não foi mesmo criado, passando a ser também, promessa não cumprida por outro órgão de soberania.

Várias lutas se seguiram no plano político, com o MRCV a desdobrar-se em esforços junto do parlamento, ao mesmo tempo que tentava cativar a opinião pública, que se revelava pouco compreensiva face às lutas de rua que se sucediam, comandadas pela "Pesada". Aos poucos, o país foi-se apercebendo da razão de Vizela. Em 1985, foi finalmente aprovada a desejada Lei-quadro de Municípios mas, mesmo assim, e não obstante os antecedentes referidos, a questão de Vizela não avançava por manifesta falta de vontade política.
Durante o consulado laranja que se seguiu, o MRCV em determinada altura, esteve perto de conseguir a vitória, já que o PSD detinha maioria absoluta, quando o líder do seu grupo parlamentar promoveu uma reunião com todos os deputados social democratas pelo circulo de Braga para saber da posição destes sobre a questão de Vizela. Nessa reunião, em que estiveram presentes elementos do MRCV Duarte Lima obteve o sim de todos os deputados para a resolução do problema. A vitória parecia certa mas, mais uma vez, a oposição de Guimarães conseguiu travar a questão recorrendo a Cavaco e Silva.
Depois disso, António Guterres, líder do PS, nas suas campanhas para a conquista de poder. afirmou, publicamente e várias vezes, que, se fosse eleito Primeiro Ministro, desbloquearia a questão de Vizela. A António Guterres, quando já chefe do Governo, foi constantemente recordada a sua promessa.
A pressão do MRCV sobre o PS foi a partir daí constante, multiplicando-se as diligências para que este agendasse o projecto da criação do Município de Vizela. Ao Partido Comunista foi, também, pedido que fizesse tal agendamento uma vez existir de novo, no parlamento, uma maioria favorável a Vizela. O PCP, não obstante se manter apoiante incondicional, aconselhou o MRCV a procurar outro partido para o faze1: A solução estava no Partido Popular: Manuel Monteiro, abordado, disse que sim, mas remeteu a decisão final para uma reunião do conselho nacional do partido que se ia realizar em Aveiro, na qual convidou o MRCV a participar e a apresentar formalmente tal pedido. O MRCV foi a essa reunião de Aveiro e teve a alegria de ver a sua pretensão aprovada. Estas boas notícias eram sempre recebidas em Vizela com agrado, dado o desejo de todos em ver a terra elevada a concelho. Mas a fé no êxito era pouca, dadas as pressões em sentido contrário das Câmaras de Felgueiras, Lousada e Guimarães, principalmente desta última, que todos consideravam ser possuidora de uma grande peso político. Só o MRCV acreditou na vitória e, com a sua persistência, conseguiu fazer avançar a questão.
O Partido Popular, o Partido Comunista e o Partido Socialista apresentaram os seus projectos Lei mas, não obstante, o agendamento teve que ser feito sob forma potestativa pelo Partido Popular, uma vez não ter havido acordo em várias reuniões dos respectivos líderes parlamentares. Finalmente foi marcada a data de 16 de Julho de 1997, mas do debate resultou novo revés para a questão de Vizela em consequência do PS ter votado contra.

Nesse dia Francisco Assis, líder da bancada parlamentar garantiu que em novo agendamento, o seu partido votaria a favor. Marcada a data de 19 de Março de 1998 por motivo de novo agendamento potestativo do Partido Popular, a vitória, tão ambicionada durante séculos, chegou finalmente. Uma vitória que dava satisfação ao desejo de sucessivas gerações vizelenses e que só foi possível pela inultrapassável dedicação, persistência e sacrifício do MRCV. 19 de Março de 1998 foi, assim, um dia inolvidável com o povo a festejar em delírio tão grande vitória, passando a constituir o marco mais relevante de toda a história de Vizela.
Com esta deliberação da Assembleia da República convertida na Lei n°. 63/98, foi a Vila vizelense elevada à categoria de Cidade e criado o Município de Vizela, englobando as freguesias de S. João, S. Miguel, Santa Eulália, Santo Adrião, Inflas, Tagilde e S. Paio, com uma área de 23,920 Km2, 16.246 eleitores e cerca de 24.000 habitantes.
Com a nova autarquia municipal, uma nova era foi iniciada , em Vizela pois as potencialidades sócio- económicas da região são de molde a augurar-lhe um futuro promissor.

Partilhar