"Do esfaqueamento às duas subidas de divisão em três dias: a vida de Tavinho"

O site desportivo MAIS FUTEBOL pela pena do seu jornalista Pedro Jorge da Cunha publicou interessante artigo sobre o avançado do Futebol Clube de Vizela, TAVINHO, contratado pelo clube vizelense ao farense decorria já o campeonato de Portugal. O jogador fez a sua estreia com a camisola do FCV contra o Braga B e marcou um golo, num jogo que foi uma lufada de ar fresco na carreira do Vizela que tinha claudicado um pouco nas jornadas anteriores.


O Mais Futebol escreve: «Avançado correu perigo de vida, mas o seu exemplo de superação foi recompensado. «Celebrámos a promoção via Zoom, com uma cervejinha», conta ao Maisfutebol

Uma história de encantar. Não é a Bela Adormecida, a Cinderela ou a Branca de Neve, não é o Capuchinho Vermelho ou Rapunzel, mas tem a magia e o encanto de um qualquer conto clássico.
Esta é a vida de Tavinho, o futebolista que há dois anos sobreviveu a um esfaqueamento cobarde e que agora celebra a conquista de duas subidas na mesma semana. A do Sp. Farense à I Liga e a do FC Vizela à II Liga.

 Tavinho, 26 anos e algarvio de coração, arrancou a época em Faro (dois jogos oficiais) e mudou-se em janeiro para o Minho. As consequências nefastas da pandemia interromperam-lhe a afirmação no emblema nortenho (quatro golos em sete jogos), mas não lhe estragaram a certeza da ascensão aos campeonatos profissionais.


Uma ascensão festejada com o devido distanciamento social, a partir da sua casa no Algarve. «Celebrámos via zoom, com uma cervejinha. Teve de ser assim», conta Tavinho ao Maisfutebol.
«O sentimento é de felicidade, mas era preferível ter subido a jogar. Era muito melhor subir a jogar através dos play-off. Há muita ansiedade. Queríamos estar a treinar, ter uma vida normal, sair com a mulher e os filhos. Não é a mesma coisa estar fechado em casa e não poder celebrar com os adeptos uma coisa tão boa.»
Vizela a 2 de maio, Farense a 5 de maio. Um futebolista, uma temporada, duas subidas. «Também celebrei a subida do Farense. Já lá estava desde 2017, gosto muito do clube, mas senti mais a do Vizela. O meu contributo em Vizela foi maior. Até à interrupção, as coisas estavam a correr-me muito bem. O plantel tem muita qualidade mesmo, há jogadores para outros patamares.»

«Já devia ter saído antes do Algarve»
Nascido em Lisboa, Tavinho foi viver para Almancil, no Algarve, aos dois anos. Passou toda a formação no Internacional de Almancil e subiu a pulso os escalões distritais até ser contratado em 2017 pelo Farense.


Moncarapachense, Louletano, Culatrense, Quarteirense, Almancilense e Farense, todo o percurso do extremo tem pronúncia algarvia até janeiro de 2020. O momento certo para fazer a mala e partir para o Norte desconhecido.
«Gostei muito de jogar no Norte. Tinha receio de sair do Algarve, por não conhecer mais nada, mas mal cheguei a Vizela vi que já devia ter saído antes. As pessoas nortenhas são muito acolhedoras, gostei bastante», diz Tavinho.

«A mentalidade é diferente. Tive oportunidades de sair do Algarve logo com 19 anos, mas preferi ficar no Algarve. Fui subindo dentro do futebol algarvio. Estava muito agarrado à família. Como não estava a jogar muito na II Liga, pelo Farense, decidi que era a altura certa para sair.»
Com mais um ano de contrato em Vizela, Tavinho está «ansioso» por voltar aos relvados da II Liga e continuar a agradar ao treinador Álvaro Pacheco.
«O Álvaro tem boas ideias, exige muito dos jogadores e é bom continuar com ele. Estou habituado a essas exigências, porque o meu clube nas camadas jovens [o Internacional] tinha um nível altíssimo. Cheguei a jogar no Nacional de Juniores contra Benfica e FC Porto, por exemplo.»


O empregado de mesa que era obrigado a faltar aos treinos
A escola parou no nono ano e Tavinho, aos 16 anos, passou a dividir-se entre o futebol e o trabalho como empregado de mesa.
«Trabalhei num restaurante em Almancil e fui obrigado a faltar a vários treinos. Tinha de trabalhar à noite e não era fácil conciliar», recorda Tavinho, a alcunha de Otávio Barros.
Na chegada aos seniores, o avançado recebeu um convite do treinador que mais o marcou - «Bruno Saraiva, o treinador que mais me ajudou e que me criou no futebol» -, foi para o Moncarapachense e iniciou um trajeto ascendente.
«Os meus grandes ídolos foram sempre o Ronaldo Fenómeno e o Ronaldinho Gaúcho. E mais tarde passei a admirar o Cristiano Ronaldo. Pensar neles sempre me fez acreditar que era possível ser futebolista profissional.»
Tavinho cresceu, impôs-se com 23 anos no Farense, mas na madrugada do dia 19 de março tudo mudou.


«O indivíduo que me esfaqueou nunca me pediu desculpa»

À saída de um bar em Vilamoura, um delinquente atacou Tavinho pelas costas. Não foi só a carreira a estar presa por um fio. Tavinho correu risco de vida.
«O incidente ocorreu em março de 2018, há dois anos. Curiosamente, depois disso subi três vezes em dois anos. Duas com o Farense e uma com o Vizela. Foi um episódio mau, até porque parou a minha afirmação. Na altura eu estava muito bem», recorda ao Maisfutebol.
«Nesse dia jogámos contra o Olhanense e garantimos a passagem aos play-off. O treinador deu-nos três dias de folga e fui com colegas da equipa a um bar em Vilamoura. À saída, um indivíduo esfaqueou-me pelas costas. Do nada. Não o conhecia, não trocámos nenhuma palavra.»
Nada justifica uma agressão bárbara. Nada justifica um ataque vil, à socapa. Um cobarde de faca na mão.
«Nunca percebi. Fomos a tribunal e o indivíduo disse que estava sob o efeito de álcool e drogas. Não me pediu desculpa até hoje. Mas não há perdão para o que ele fez», desabafa o atual atleta do FC Vizela.
«Temi pela minha vida e temi não voltar ao futebol. Só ao quarto dia é que o médico me disse que eu estava fora de perigo e que poderia jogar. A pleura foi atingida e quando recomecei a treinar parecia que ia desmaiar. Custava-me a respirar. Mas já tenho aqui os pulmões impecáveis.»

Esta é uma história que acaba de bem. Encantadora. Tavinho sobreviveu a um atentado, voltou aos relvados, a fazer golos e na passada semana celebrou a subida de divisão por dois clubes diferentes. Um clássico de superação, a vida de Tavinho.

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