O Frei Geraldo José Amadeu Coelho Dias escreveu num livrinho sobre o Santuário de São Bento das Peras, editado pelo Instituto de História e Arte Cristãs, que a montanha já era chamada por monte de São Bento desde pelo menos o século XII. A primeira vez de que há registo deste nome é em 1195, num documento do mosteiro de Vilarinho, em que é contratualizada a venda de um terreno no sopé do monte.
Nesse documento, está inscrito outro saber curioso, mas que não será o objeto deste escrito. Pois que “Em nome de Cristo: Eu Godinho Afonso, filho de Exemena Varela… uma carta de venda, da minha herdade, que tenho na vila Lagoa (na original vila Lagona), isto é uma porção de dois casais, abaixo do monte de São Bento, onde corre o rio Vizela.” O saber curioso de que falo é que, há uns dias, num outro escrito dizia não saber as origens do topónimo Lagoas. Pois aqui não esclarece, mas pelo menos ficamos a saber que o termo é tão antigo como o do monte de São Bento e que remonta à própria fundação da nacionalidade.
A denominação da montanha, não deverá ser alheia a proximidade com o Mosteiro de Pombeiro, fundado possivelmente em 1059. Mas a sacralização da montanha de São Bento é anterior à era cristã. Disso já dava conta a conhecida historiadora vizelense, Dra. Maria José Pacheco, num texto que foi compilado no seu livro “Das Margens do Vizela” numa edição da editorial Magnólia. O texto a que me refiro, vem na página 629 e chama-se “Vestígios Arqueológicos do Monte de São Bento” e todo ele reporta ao curto estudo arqueológico levado a cabo pela Dra. Fátima Sousa, nos anos 70, no monte de São Bento. Sou levado a crer, que a investigação decorreu do facto de, à época, estar em curso uma campanha arqueológica nas proximidades, na serra de Campelos, entre Lustosa e Barrosas, para levantamento das diversas mamoas aí existentes. Possivelmente, algo ou alguém, atraiu esta arqueóloga ao monte de São Bento. Talvez Armindo Pereira Caldas, conforme parece depreender-se das palavras da Dra. Maria José Pacheco.
Das conclusões da Dra. Fátima Sousa, destacam-se três elementos: a cista, o mais conhecido e razão deste texto; uma gruta ou abrigo neolítico; e dois achados, cujo paradeiro se desconhece: um arado neolítico em pedra polida e um punhal de cobre.
Ora, é sobre a cista que pretendo escrever e começo por abordar a origem da palavra. ‘Cista’ é um termo latino, de origem grega, que significa caixa ou recipiente. Do ponto de vista arqueológico, uma cista é um monumento funerário megalítico que consiste num sepulcro, geralmente de formato retangular construído por pedras ao alto, que se designam esteios. Sobre os esteios assenta uma outra pedra que se designa por mesa. Normalmente uma das faces verticais é a abertura para a câmara funerária. Portanto, no essencial, uma cista é um dólmen de dimensões mais pequenas.Dólmens e cistas são câmaras fúnebres semienterradas.
Estas estruturas eram usuais durante os períodos Neolítico e Calcolítico, por isso entre os anos 5.000 a 2.000 a.C. Mas ainda, quanto à sua construção, este conjunto de pedra, era coberto por uma couraça de terra, por vezes misturada com pequenas rochas tipo cascalho, formando um pequeno monte. A este montículo é dado o nome de mamoa por fazer lembrar um seio feminino. Portanto os dólmens e cistas são câmaras fúnebres semienterradas.
Relativamente à cista de São Bento, a Dra. Fátima Sousa descreve o que encontrou: “Mamoa elíptica com o diâmetro maior de 12 metros e 40 centímetros no sentido oeste-noroeste leste sudeste e o diâmetro menor de 10 metros e 20 centímetros. Na parte central, fica o dólmen ou cista megalítica, constituída por uma câmara rectangular delimitada pelos seguintes elementos; a oeste-noroeste, um esteio, peça única, de granito local, porfiróide, trapezoidal, (com 1 metro e trinta de base, 1 e 20 de altura e 18 centímetros em média de espessura), ambos in situ; a sul-sudoeste, parede com dois blocos desiguais do mesmo granito, ambos in situ, medindo o maior dois metros e 25 de base por 1 e 10 de altura e cerca de 20 centímetros de espessura e o menor com base de 50 centímetros, altura de 1 metro; e espessura média de 13 centímetros; do lado nor-nordeste há duas lajes do mesmo material lítico, tombadas, medindo uma 1,70 por 0,20 m, e achando-se a outra semienterrada: o lado que falta, ao oposto indicado primeiramente, não apresenta estruturas líticas, sem dúvida que foram daí retiradas; terra saibrosa.” Acrescentou ainda: “Consta que a mesa foi retirada há muitos anos para dela se fazer uma lareira na casa de uma quinta”.
Portanto, não nos sobram dúvidas de que a cista de São Bento é um pequeno dólmen cuja mamoa, segundo a arqueóloga, teria, ainda assim, um diâmetro superior a 12 metros, o que já nos dá uma noção da implantação do monumento. Com base na descrição e no que é o conhecimento geral destas construções, juntamos algumas fotos do local e do monumento e experimentamos uma reconstituição por inteligência artificial. O resultado, ainda que, evidentemente não se tratando de uma reprodução fiel, ajuda a criar uma imagem mental do que seria o local no período neolítico.Recentemente, a Câmara Municipal de Braga, produziu um documentário premiado, facilmente localizável na Internet, “A Mamoa de Lamas, um segredo ancestral” que ajuda a entender estas construções e as comunidades que delas se serviam. Note-se que para além da utilidade fúnebre, eles também consistiam numa forma de marcação de território e de soberania das comunidades.
Um aspeto que importa realçar, são as aberturas dos dólmens que por norma estavam voltadas a nascente. Desse modo ao nascer do dia, os primeiros raios de sol iluminavam o interior da câmara. Ora no caso da cista de São Bento também parece ser assim. Da análise que me é possível, estou em crer que a abertura também está voltada a nascente e corresponde ao lado em que a Dra. Fátima Sousa diz não ter material lítico e que parece ter sido escavado.
Com a romanização, chegou o cristianismo e a história demonstra que geralmente os locais sagrados das comunidades pré-históricas foram reconvertidos em locais de culto cristãos. No caso de São Bento e, conhecida a antiguidade do culto nesta montanha, dá consistência à sacralização cristã dos símbolos pagãos.